Piauí

DIÁRIO PESSOAL DO CIRCUITO DE ARTES VISUAIS EM TERESINA
Guga Carvalho (1)

Primeiramente, Fora …

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Lili Martins

Quando recebi o convite-intimação para elaborar um texto, para o projeto Livre Troca, sobre o circuito de artes visuais em Teresina, comecei , então, um esboço para um diagnóstico, apontando agentes culturais, espaços, n problemas, n coisas bacanas etc. Minha experiência pessoal ficava a uma distância segura, em nome da objetividade capaz de retratar, com certo discernimento, a cena da cidade. Quando reli as primeiras linhas, achei que essa distância estratégica, que alguns sabem construir com clareza e elegância, soava, no meu caso, como algo desinteressante; muito pela minha falta de capacidade descritiva mais encadeada.

Diante disso, preferir me colocar mais perto das coisas, dentro mesmo, dando minha opinião sobre a cena da cidade e região de maneira pessoal e bastante parcial (beirando, quem sabe, o passional), arriscando até alguns exercícios sobre coisas que ainda nem aconteceram, mas que – intimamente – torço para que aconteçam. Daí, primeiramente, fora o tom impessoal! Vou indo aqui numa espécie de diário de ações, pontuando lugares, artistas, instituições e políticas de cultura nas quais me atravesso.

Atuo no campo das artes visuais na cidade há muitos anos, seja com projetos independentes com o coletivo Abacateiro (que no passado já foi bem mais atuante, confesso), ou com minha microempresa de nome pomposo Guga Carvalho SA ou como agente cultural, anteriormente da Fundação Estadual de Cultura e , atualmente, como coordenador de artes visuais da Fundação Municipal de Cultura. Mas, antes de seguirmos , é bom advertir sobre a tentação inicial.

A tentação

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Torquato, neto como Adão

Geralmente quando nos propomos falar sobre o circuito de artes em cidades como Teresina [PI], isso, nos leva a vomitar uma lista de queixas: “falta isso” e “não tem aquilo”. Não que estas queixas sejam inverídicas e que desabafos não mereçam, de vez em quando, momentos de audiência, – gosto sempre de ler críticas de artistas sobre o circuito de suas cidades, – mas, se eu fosse falar sobre o que falta e os empecilhos ao pleno desenvolver do meu trabalho em Teresina, não sei nem por onde começaria. É de chorar, mesmo! Então, para não sofrer mais ainda, vou apontar o que  se é possível fazer (mesmo que de vez em quando eu possa dar uma choradinha básica).

Teresina

Projeto Fronteira

Projeto Fronteira

Teresina é claramente um tanto distinta daqueles centros onde a arte contemporânea brasileira encontra condições mínimas de existência:   formação, produção, financiamento, reflexão, troca e circulação. Mas, a seu modo, a arte contemporânea existe – e resiste – através de algumas ações coletivas independentes e nômades, alguns espaços autogestionados por artistas, e até mesmo, algumas políticas públicas. Vamos começar com uma pesquisa (a meu ver, deliciosa) que venho aprofundando e expandindo sobre o Desbunde Piauiense e apresentando no circuito da cidade em forma de exposições, mostras de cinema, debates, catálogos e livros.

O Desbunde Piauiense

Bernardo sobre foto com Arnaldo

Bernardo sobre foto com Arnaldo

O ano de 72 foi o marco da contracultura em Teresina. Torquato, neto (seu nome pode ser escrito dessa forma também) depois do frenesi dos anos tropicalistas e de sua temporada em Londres e Paris, volta à cidade, cheio de ideias, alucinado pelo cinema (dito) marginal nascente. De imediato se interna no sanatório Meduna, onde passava os dias criando.

Por cartas, Torquato, articulava com Wally Salomão a revista “NaviLouca”, e, ao mesmo tempo, se articulava localmente com um grupo de jovens criadores ligados ao jornal mimeógrafo “Gramma”, galera com quem filmou seu filme “O Terror da Vermelha”(72). Entre esses parceiros estava Arnaldo Albuquerque ( imagem 4), que juntamente com T,n são as grandes figuras desse Desbunde. Arnaldo, apesar de ser o mais explicitamente político da turma, também, comungava de uma total contestação comportamental e experimentações de linguagens contemporâneas como seus parceiros.

Choradinha: Recentemente o prédio do Sanatório foi desocupado e entregue à Prefeitura.Pedi encarecidamente que se fizesse um espaço Torquato, neto para residências, mostras, exposições; mas não rolou, pois já havia um outro projeto anterior para lá. Tentei de todo jeito, mas…. Ah, como seria instigante!

Nos últimos anos venho garimpando, com paciência monástica, coisas fabulosas que andam soltas por aí dos criadores do Desbunde , algumas quase perdidas, como vários outros filmes em super8, desenhos animados em lanterna mágica, (inclusive os originais quadro a quadro) instruções para performances e para instalações (que nunca foram realizadas), HQs deliciosas, fotografias etc. e etc.além de depoimentos ( muitas vezes contraditórios).Esse material vem dando origem a várias exposições em Teresina e algumas também fora, como “Arnaldo Albuquerque: Narrativas da Contravenção”( co-curadoria de Bernardo Aurélio(PI)) e “Atalho para Bem Ali”( co-curadoria Solon Ribeiro(CE). Também houve a exposição “O Filme Perdido”, feita a partir do still fotográfico do filme em super8 “Adão e Eva do Paraiso ao Consumo (72), com Torquato, neto e que foi extraviado (notem, não destruído) quando o mandaram para fora, afim de se fazer uma cópia.

Essa exposição se desdobrou num livro do mesmo nome, “O Filme Perdido”, onde discuto esse tipo de presença em suspensão do filme a partir das imagens, e foi distribuído para muitos museus, centros culturais e escolas de artes de todo o Brasil. Enfim, o Desbunde Piauiense é um assunto corpulento que vem sendo posto em pauta na cena de artes visuais de Teresina, e ,pouco a pouco, se expande para fora do Piauí, com interesse cada vez maior por parte de pesquisadores e instituições de fora, como era de se esperar.

Dentro e Fora do Desbunde

Capa Navilouca

Capa Navilouca

O nome de Torquato, neto continua despertando atenção de muita gente no Brasil, mas de diferentes formas. Por aqui, além de apresentá-lo junto aos parceiros do Desbunde Piauiense, o tenho, como a Arnaldo, lhe atirado em exposições individuais; sobre minha pesquisa a sua obra onde foco suas experimentações visuais pouco conhecidas no circuito brasileiro. Essa desinformação sobre Torquato deve-se em parte porque a recepção posterior a sua obra foi bastante preguiçosa, colocando o rapaz em rígidas rubricas de poeta “tradicional”, letrista de música e jornalista; somado a uma certa chantagem cultural barata sempre disposta a chamar mais atenção a aspectos da sua biografia de poeta suicida e “tropicalista injustiçado” pela história do que a qualquer outra coisa que realmente valha.

Muito mais que isso, Torquato foi um experimentador, catalizador atento das questões contemporâneas de sua época. No dizer de Décio Pignatari: “representante da nova sensibilidade dos não especializados”. Em 2014 organizei uma exposição chamada Balão de Ensaio, produzida pelo produtor, artista e pesquisador de fotografia analógica Danilo Medeiros, com filmes, fotografias, performances para câmera, desenhos, rascunhos, vários poemas visuais, roteiros para cinema, textos críticos sobre cinema e sobre arte contemporânea e para dar aquele charme, selecionei algumas cartas entre Torquato e Oiticica das quais as questões das artes visuais são a tônica. Enfim, um Torquato que não se encontra facilmente por aí, nem em biografias que passam ao largo, nem em docs., muito menos em exposição de artes visuais. Alô, alô distintos museus do Brasil!

Depois disso, lancei, com Danilo Medeiros,  um livreto chamado Torquato, Escrita da Incompletude que trata dessa pesquisa ao seu acervo, das dificuldades em, entre outras coisas, precisar o tamanho dos poemas visuais que foram aparecendo sem respostas precisas, quando nos vimos diante de um acervo que nunca havia sido antes ativado a partir das perguntas das artes visuais.

Acima de tudo, pesquisar Torquato é editar constantemente fragmentos difusos que somente alcançam sentido se, como um bicho de Ligia Clark, os manipularmos de lá para cá. Quem viu a exposição Balão de Ensaio, na Casa da Cultura de Teresina, pôde entender melhor essa outra lógica combinatória do processo de criação de Torquato, que, como defendo em meu argumento curatorial, se plasma melhor no espaço expositivo, com suas múltiplas possibilidades de ordem de leitura, do que nas páginas (sequenciais) dos livros. 

Catandub(v)a

Exposição Catandub(v)a

Exposição Catandub(v)a

Por falar em outra lógica, o Sesc abriu ano passado um centro cultural super charmosinho na cidade de Parnaíba, onde funcionou, no passado, uma escola técnica de contabilidade chamada União Caixeiral . Fui convidado para fazer a curadoria da exposição inaugural. Pois bem, há um artesão na cidade chamado Mestre Francisco Ribeiro, um velho índio cearense, radicado no Piauí desde criança, que faz uns cachorrinhos de madeira de catanduva (no popular: catanduba) que sempre me chamou muita atenção.

O cachorro de madeira do mestre guarda muito a forma do galho e, ao mesmo tempo, é outra coisa. Opera numa outra lógica escultórica não dominadora da matéria, mas em concordância com suas sugestões formais intrínsecas.

Pois bem, sugeri ao Sesc, o mestre junto a um outro artista do vídeo e cinema, Danilo Carvalho e a equipe do Sesc prontamente topou. Passamos vários meses de pesquisa, Danilo e eu, discutindo ponto a ponto o que seria essa exposição que veio a se chamar Catandub(v)a.

O tema da mimese ancestral, tão presente em minha cabeça devido aos meus estudos apaixonados a Walter Benjamin, contagiou naturalmente Danilo, e então se apresentou como clarificador da complexidade da percepção mimética dos povos não civilizados, de cultura oral, como o índio Francisco e seus cachorrinhos-galhos. (não civilizado aqui não tem nenhuma conotação pejorativa, visto que civilizado também não é, em si, sinônimo de nenhum ideal a ser alcançado) Danilo , na exposição, se travessa ao mundo do mestre Francisco Ribeiro quando em seus momentos de leitura mimética da mata a partir da decodificação formal que esse faz da árvore catanduva. A exposição ficou muito interessante e vai circular por outros lugares também. Para mim, será um imenso prazer poder compartilhar a obra do mestre Francisco, já com mais de 80 anos, com outros públicos.

Casa da Praia da Pedra do Sal
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Falando em Danilo Carvalho, entre outros tantos projetos que tocamos juntos, mais um merece ser citado aqui: o projeto de Residência da Casa da Pedra do Sal. A casa, à beira do mar, no litoral do Piauí, é propriedade de Danilo e se encontra em fase final de reforma para receber mais pessoas. A casa tem o estilo paraqueira do premiado arquiteto piauiense Gerson Castelo Branco, feita de madeira e palha de carnaúba, e pousa como uma rústica nave espacial sobre as pedras “arpuador” – praticamente dentro do mar – da Ilha Grande de Santa Isabel, a primeira ilha do Delta do Parnaíba; em meio a uma comunidade de pescadores e mulheres rendeiras. O lugar está sendo pensado como uma espécie de Ancoradouro de projetos, articulando com várias pessoas do Brasil e fora, e a recepção tem sido bem animadora. Esse tópico é pura propaganda do que ainda nem aconteceu, mas é coisa boa, podem crer! Em breve teremos a primeira residência.

A Residência de Artes Visuais de Teresina

Residência de criação

Residência de criação

E falando em residência, assumi a coordenação de artes visuais da Fundação Municipal de Cultura de Teresina há um tempo atrás. O Salão de Artes Plásticas da cidade, depois de muitas e muitas edições, agonizava sem forças. Se no passado o formato salão era um modelo de política cultural que dava impulso a uma carreira, hoje em dia, ganhar ou não esse salão é absolutamente irrelevante. Precisávamos, ora pois, pensar em um formato que estimulasse o criador e fomentasse à pesquisa e reflexão sobre o trabalho.

Fizemos então algumas reuniões na casa da artista Fátima Campos (uma escultora da cerâmica que há muitos anos pesquisa as potencialidades desse material, criando obras tridimensionais muito boas). Estavam presentes na reunião, além de Fátima e eu, Babidú Barboza , hoje uma referência em performance no Brasil, integrante do Grupo Empreza de Goiânia, mas de RG teresinense;  Marina Medeiros, curadora da cidade com interesses focados na mediação; Danilo Medeiros (já citado aqui nesse texto no tópico Torquato), além de outras pessoas da área.

Juntando o que o grupo elencou, formatei quatro projetos e apresentei à Fundação, entre eles o projeto para o Prêmio de Criação em Artes Visuais: residência de três meses com até sete criadores com bolsas mensais. O projeto emplacou e a residência permitiu algumas pesquisas de fôlegos.Cito aqui três projetos de criadores de Teresina que acompanhei como curador do processo e que particularmente gostei muito: “Fronteira”, “Quintal” e “Escalpo”.

Tássia Araújo(PI) / Projeto Fronteira / T. A. veio a saber que Teresina é atualmente a cidade brasileira com mais chineses, proporcionalmente. Isso trouxe um outro sabor ao velho pastel e caldo de cana e, também, ao seu fazer fílmico. Contudo, sua intenção primeira de registrá-los em seu universo sofreu um revés pela recusa desses em participar. As imagens para seu projeto “Fronteira” tiveram que ser feitas de forma clandestina, e foi nesse ponto que o trabalho foi encontrando seu sentido, abrindo a discussão sobre essa imagem/mercadoria contrabandeada. Diante da estigmatização “mercadoria chinesa” o projeto enfrenta a decisão de investigar alguns sentidos poéticos e críticos desse lugar conflituoso.

Willyams Martins (BA/PI) /Projeto Escalpo / W. M. pode ser descrito como um investigador poético de falas e ruídos dos muros das cidades. Toma para si as superfícies em seus substratos plásticos e que devem ser retirados através de uma técnica de decalque (resina de poliéster látex) e depois emoldurados. Resta-nos entender o seu trabalho a partir, e muito, do desconforto e ruído que ele provoca. A título de curiosidade: Em Salvador a revolta dos artistas de rua foi tão forte contra Lili (apelido de Willyams) que até Caetano Veloso teve que se envolver para defendê-lo. Cartazes foram espalhados em seu bairro com os dizeres” Lili Lalau”. Lili, com sua resina, os pegou, emoldurou e ficaram lindos!

Maurício Pokémon(PI)/ Projeto Quintal /

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Projeto Quintal

M.P. atravessa os quintais do centro de Teresina e se agarra em três trilhas de sentidos que se formaram no processo de pesquisa: quintal como lugar de afetividade (churrascos, festas, brincadeiras de crianças etc.); como limbo dos objetos de casa; e também investigando como esse quintal é para os moradores um estúdio fotográfico amador. M.P. usa sua câmera como dispositivo para disparar assuntos, mas também se entrega à fotografia feita por esses personagens, vasculhando álbuns antigos e caixas esquecidas. A essas fotografias de terceiros, o artista trabalha com apropriação, não diretamente na imagem, mas de forma muito sutil: duplicando umas ali, nomeando outras aqui, relacionando-as com outras, etc. Enfim, processando uma alquimia de sentido por trilhas que repensam ao mesmo tempo o estatuto dessas imagens e desse lugar prenhe de sentidos: o quintal.

Abacateiro

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Escambo de figurinha no Abacateiro

E por falar em quintal, indo no fluxo da metáfora do pé de abacate, árvore que só dá fruto se trocar informações pelo ar com outra, o coletivo Abacateiro nasceu em Teresina há uns quatro, quase cinco anos . O coletivo desenvolve projetos com vários e diferentes colaboradores, em todos esses há uma tônica dominante: a troca.

Fábio Expiga, artista visual e designer gráficoe eu estamos presentes em todas as ações como uma espécie de núcleo duro, que agrega outros parceiros a cada projeto.

Um dos nossos projetos permanentes Escambo de Figurinhas aconte pelos ateliês e casas de artistas da cidade. Sempre convidamos algum artista, coletivo, curador de fora para entrar, dia e hora marcada, no Skype – projetado na parede – e avisamos a cidade. Passaram várias pessoas, via Skype, como Regina Silveira (SP), Grupo Empreza (GO), Marco Paulo Rolla (MG), Nadan Guerra(RJ) etc etc etc .

Além do Escambo, o Abacateiro, juntamente com o coletivo OcupeaCidade de São Paulo, deu início ao um circuito de trocas de lambe lambe, chamado Circuito Grude. O Grude consiste em trocas regulares de ano em ano, entre várias cidades, o que tem sido super interessante. Natal, Brasília, Rio de Janeiro, Fortaleza, Curitiba, Porto Alegre, Florianópolis, Niterói, Porto Velho, São Paulo, Teresina, entre outras cidades trocaram, trocam e creio que ainda trocarão muitos lambes.

Já a feira de  Troca-Troca do Abacateiro funciona só entre artistas que vivem em Teresina, houve algumas edições no passado e, assim como Gurde, creio que haverá no futuro. Troca-se de tudo, livros de arte, desenhos, pinturas, antiguidades etc.

Agora, em 2017, o Abacateiro completará cinco anos de atividades. Estamos produzindo uma festa no espaço independente Balde, um espaço múltiplo, localizado no bairro do grande Dirceu, autogestionado pelos artistas Jacob Alves e Izabelle Frota. Coincidentemente, o Balde fica quase em frente ao Teatro JP2, onde anos atrás sediou o projeto de criação em dança contemporânea Núcleo de Criação do Dirceu articulado pelo coreógrafo Marcelo Evelyn e fomentado pela Fundação de Cultura do Município, no qual Izabelle e Jacob fizeram parte.

O Balde tem dois andares bem grandes, no de baixo funciona bar, mini palco e o projeto Ateliê Selvagem, onde o artista residente desse ano André Gonçalves, editor de uma revista de cultura da cidade, chamada Revestrés ,  divide espaço com outros artistas nômades alternados. Na parte de cima, um vão imenso onde acontece oficinas e apresentações de dança contemporânea, e um espaço expositivo, para onde está sendo montada a minha exposição com instalações feitas a partir do mapa astral de alguns artistas da cidade.

O Céu Pessoal da Cidade

Totem do mapa

Totem do mapa

Amo a linguagem da astrologia com a profusão de sugestões poéticas que são evocadas na leitura de um mapa astral. Desde 2009, venho fazendo visitando a casas de amigos, propondo uma tradução plástica, feita com os objetos domésticos, dessa miríade de códigos que se engendram simultaneamente nos aspectos da carta natal. Na casa das pessoas proponho uma organização com alguns objetos da casa, que é uma transcodificação em linguagem objetual do mapa da pessoa que aí habita . Os códigos astrológicos próprios: elementos, signos, casas, planetas , pontos e aspectos vão guiando  à organização dos objetos do lar. E ,assim, uma espécie de instalação vai configurando de maneira, por vezes, confusa.

Cada mapa é retrato de um momento do céu, é um mundo de combinações originais, concatenações abstratas, sugestões metafóricas, padrões energéticos e comportamentais. Cada espaço doméstico é outro mundo à parte, habitado por objetos carregados de funções, simbolismos, formas, cores, afetos e históricos. Procuro dispor num mesmo contínuo, esse conjunto de códigos da linguagem astrológica para uma linguagem plástica e coloquial, que se faz com os objetos do cotidiano.

Para exposição no Balde escolhi fazer o mapa de alguns artistas da cena local que considero interessantes e então armo um diálogo com eles. Levarei, então, para o espaço expositivo os objetos, fotos e vídeos do totem do mapa da Elielson Pacheco Saraya, travesti da dança contemporânea, experimentadora de projetos em vídeo e fotografias (como a série “babado” feitas com “closes certos” do seu cocô. tem uma nessa série em especial que gosto muito e já esteve presente em exposições que curei, o título da obra:  Portal para Xanadú. dá-lhe Saraya!) O mapa astral da cuja se transmutou numa instalação feita de muitos brincos (elementos de transformação-plutão), pedras e tamboretes velhos (saturno), varal de roupas (sol) etc. Pois sempre escolho um aspecto ou casa astrológica que vejo que é dominante naquele mapa, para então transcodificar seus planetas, aspectos etc..

Outro mapa que não poderia ficar de fora é o do Jamelus Rego, um dos jovens pensadores da cidade, com um charme na organização do pensamento em seus ainda poucos textos sobre arte e expressões culturais. Jamelus foi um dos vinte artistas que estiveram comigo, durante todo o ano de 2015, nos encontros periódicos de imersão do projeto ArteSesc Confluências, onde eu dividia o acompanhamento dos artistas com o Alexandre Serqueira(PA). Jamelus é um ser de reflexão e seu mapa e instalação trazem muito isso. Seu imenso guarda sol de praia se abre (Júpiter, expansão) sobre mapas de cidades pegos em viagens ao exterior (casa nove) “temperados” de pedras de gelo (netuno na nove) e outros elementos ilícitos.

O desdobramento dessa experiência de interpretação é sempre excitante (pelo menos para quem faz, rs), por mais que seja muito simples plasticamente o resultado. Vai ser tudo de bom! Vai ser lá no Balde. Espero vocês!

Para finalizar
Na minha experiência, Teresina e seu circuito de artes visuais passam por várias questões, zonas de negociações, compartilhamentos, camaradagens, tensões (&*%#!!!), possibilidades, antagonismos. Atuo nesse circuito como gestor, curador, pesquisador, produtor, articulador, criador e … público assíduo do trabalho dos outros. Há outras coisas, projetos de outros e meus ou nossos enfim …  que poderiam constar aqui, mas não cabem por falta de espaço. Já estou passando do tamanho prescrito pelas regras (necessárias) do Livre Troca. Um transbordamento de quem não tem muito poder de síntese, mas não deixa de ser uma licença poética, como poético é o ato de trocar experiências com outras pessoas de tantos lugares diferentes proporcionado por esse projeto-encontro em Maceió.

Nota:
(1) Texto finalizado em de 05 dez 2016.

Lista de imagens:
Por ordem: 1) Lili Martins, foto Alexandre Santos. 2) Torquato, neto como Adão, foto Antônio de Noronha. 3) Projeto Fronteira, foto Tassia Araújo. 4) Arte de Bernardo Aurélio sobre foto, com Arnaldo Albuquerque, de autor desconhecido. 5) Capa NaviLouca, retirada em coletivocultural.wordpress.com.br; 6) Exposição Catandub(v)a, foto Danilo Carvalho. 7) Praia da Pedra do Sal retirada em piauí.com.br. 8) Residência de Criação em Teresina, foto Maurício Pokémon. 9) Projeto Quintal, foto Maurício Pokémon. 10) Escambo de Figurinha do Abacateiro, foto Fábio Expiga.11)Totem do Mapa do Jamelus Rego, foto Babidú Barboza.